sábado, 17 de agosto de 2013

Um café e uma garrafa de água, se faz favor.

Foto de Xavier Madeira, Pôr de sol em Vila Real de Santo António (via Zezinha Caldeira)






A mesa do café são muitas mesas e cadeiras. À volta de um café. Uma água sem gás. Natural. Fresca. Uma água das pedras. Um descafeinado...

Um bafo de calor deixa no ar as conversas. Uma esplanada. As  cadeiras a puxar um design sofisticado. Sentam-se. Pessoas. Amigos de sempre. Estão juntos uma vez por ano. Quando voltam à terra: todos temos uma terra, dizia a Irene Lisboa. Alguns não se viam há trinta anos. Perderam-se em bons empregos. Cresceram em empregos medíocres. Fizeram de empregos muito pequeninos, boas carreiras. Outros voltaram sem emprego. Sem par. Sem família. São muitos e dão conta do que a infância lhes deixou. Têm histórias do tamanho das vidas que viveram. Contam bocados de felicidade. Esquecem o inverno frio e já sabem de cor as tristezas que lhes turvaram os caminhos. São histórias banais. Histórias que se leem nos jornais. Que se percebem no eco das palavras sobre o melhor lugar ao sol, o melhor livro, as piadas dos filhos, o sucesso, as apreensões, o mais desgraçado dos políticos. Nem sempre estão de acordo. Mas riem em coro. Soltam-se. Gostam de estar juntos. Alguns, ainda, guardam zangas antigas, despeitos, rancores. Sentam-se, com delicadeza, nos lugares mais distantes da mesa grande com muitas mesas. Percebem-se na cumplicidade de que é feita a amizade. A tagarelice é um bem, que gastam com prazer. Há algures, as festas da moda, as festas brancas e de todas as cores, os lugares de sonho, os festivais, os recantos do país real e dos bolos de canela acabados de cozer. As cascatas. As viagens. Os cruzeiros. Não estão interessados. Não foram. Não prestaram atenção. Não comeram. Não se importam. Estão entre os seus. A família dos filmes de aventuras, das correntes do pelourinho, da praia. O tempo passou por todos. Deixou um espaço que lhes pertence, por direito e por amor. Do outro lado, o rio que corre na sua aldeia. Os que voltam todos os anos, os que vivem neste rio, os que já não voltavam, os que não voltarão e os que cresceram a seu lado. Antes de se sentarem, cumprimentam-se. Beijam-se nas faces. Abraçam-se. Dão as mãos. Tocam-se. Olham-se. E mais um abraço. Estão bem. Têm os olhos a brilhar. Entendem-se. Estão felizes. Às vezes, o suão leva a tristeza para muito longe. Mas só a tristeza.

É verão. Está muito calor. Ao céu deste mês de encontros não faltará a lua cheia.

Quase cheia. Ficaremos à sua espera.

(- Um café e uma garrafa de água. Sim. Fresca e sem gás. Se faz favor. Alguém quer mais alguma coisa?)


 

2 comentários:

  1. Adorei!. Uma amarguinha? Uma taça de vinho tinto? Um vodka fora de horas?

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  2. ora, aqui está um fim de tarde em Vila Real de Santo António, ali na praça. Ou um café depois do jantar. Sem tirar, nem pôr, é mesmo isto. E o suão, amiga, leva o que deixamos que leve:)

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