sábado, 4 de agosto de 2018

Stevie Wonder I Just Called To Say I Love You











Uma conversa telefónica pode não mudar o curso da tua vida mas tansformá- la, num segundo, num inferno.Eu gosto de falar ao telefone da mesma maneira que gosto de gin tónico, uma boa conversa, ou,  às vezes,  preencher o vazio dos dias muito ocupados de trabalho ou de trabalhos. Quando era muito miúda, utilizávamos o telefone para confirmar as banalidade do quotidiano, confirmar um jantar, perceber se estaríamos no bom caminho - frase que ainda hoje desconheço o significado - justificar uma ausência ou dizer que tínhamos chegado bem, ao nosso destino.Em casa dos meus avós existia um aparelho preto, imponente, achava eu, do qual muitas vezes dependia a alegria , ou a tristeza, dos meu avòs - o casal maias apaixonado que conheci. Os meus pais usavam-no senpre à mesma hora - o que achava extraordinário - para dizer que  apesar de estarem em coordenadas diferentes se continuavam a amar e, claro está, controlar o cumprimento dos meus trabalhos de casa. Tenho recebido, por telefone as piores notícias: " tem um tumor maligno precisa de ser operadada com urgência", "não gostamos da lesão na sua mama esquerda", " a sua mãe não está bem, venha para o hospital quanto antes", além das banais "tem uma factura da Zon em atraso" ou o seu débito directo foi devolvido". No entanto, gosto de falar ao telefone, desde que não me insultem - um ou outro pretendente a namorado e um encarregado de educação mais boçais (como conseguirão eles o meu número de telefone, ainda é, para mim, um mistério), gosto das palavras de conforto dos amigos, dos carinhos sinceros em momentos de dor, ou, apenas, da banalidade da pergunta :"como tens passado?". Desde a África mais ocidental até à Europa mais oriental - sítios, ente outros, por onde passei, sempre a 'bem da nação' - o telefone tem sido uma companhia, um conforto, um abraço longínquo, provavelmente, mais sincero que muitos outros que tenho usado,  ao longo da vida.Tenho, no entanto, dificuldade em entender, por que razão um telefonema se tornou , nos últimos tempos, num acto de 'desfazer orgulhos': "não lhe telefono, porque é ele ou ela estão em falta comigo", "não telefono, porque não posso mostrar fraqueza", "era só que faltava , ligar-lhe depois do que ele (ou ela me fez)", e o telefone que aprendi e me foi  apresentado como um um qualquer electrodoméstico tornou-se 
a) num consultório sentimental;
b) num fazer e desfazer de orgulhos;
c) num instrumento utililizado para controlar se B dorme com Y , ou A traíu - odeio esta palavra por ser tão falsa: que é a traição? ; 
d) seja mais um elemento de destruição entre as pessoas.
Claro que vivemos momentos de grande dificuldade de comunicção entre os  nossos, é certo que sem cinema, teatro, concertos, ou tertúlias , nos tornámos em verdeiros " Zazie dams le métro", mas que diabo, custará assim tanto pegar no telefone e dizer,apenas " I just call to say I love You?"

Mandem o argumento de que eu não sou  deste tempo para o caralho, porque EU SOU DESTE TEMPO - ainda não morri, vivo há 59 anos nesta medida do tempo, e " no meu tempo é que era bom" é uma falácia,  porque o meu tempo é hoje - hic et nunc - , porque é aqui que eu acompanho os meus filhos, dou apoio ao meu pai e vou beber um gin tónico onde quero e me apetece. Também é neste tempo que oiço Cure, Jacques Brel ou Modern Jazz Quartet. Sem esquecer o concero dos Scorpions - óptimo concerto, alíás, com o meu fillho João. 
Foi neste tempo que me curararam o último tumor e é neste tempo que me reapaixonei pela Patti Smith - agora é que serei queimada no caldeirão daquela tela que faz parte do acervo do Museu das Janelas Verdes. 
Não quero saber!

E, se a minha voz se fizer ouvir - dúvida que não tem importância nenhuma que exista - peguem no telefone e liguem aos amores da vossa vida : " I just Call to sayn I love You!"
Mais ou menos como os douradinhos da Iglo ou novos iogurtres que nos põe a faze cócó, porque " é tão natural  como a sua sede"



Deixem-se de poses, esqueçam o feicebuque, organizem  o Instragram e agarrem no telefone e digam "às vossas pessoas"que gostam delas..."



(Desculpa, mamã, mas disse-to tão poucas vezes, atenção, não é o remorso que  me leva a escrever estas frivolidades, porque eu estive a teu lado, quando precisaste, tenho pena que não possas estar , mais vezes, aqui comigo. Histórias diferentes - e, se o tefone nos tivesse aproximado,ainda mais. " Mamã, ainda me achas bonita e interessante? Sabes, eras a única pessoa a quem poderia perguntar, sem pudores, estas perguntas tão sem sentido.)

https://youtu.be/ILbUdPUO8PE




quinta-feira, 2 de agosto de 2018

A resposta que se impunha.

A resposta que se impunha.




Meu amor - que ironia.

Mandam as regras da boa educação e, considerando o teor assustador do último email, informar-te que, pela gravidade que a minha lesão na mama esquerda apresentava, os médicos anteciparam os exames, assim, fiz todos os exames e análises  necessários no dia 14, no Hospital da Luz. Na realidade, a lesão é grande, mas não apresenta qualquer grau de malingnidade, terei de fazer, com regularidade, os exames de rotina normais e nada mais. 
Também não foi desta que o cancro me apanhou....
Estou em paz e serena.

Dou-te esta informação, não por considerar que a minha saúde seja uma das tuas preocupações, mas, porque a minha consciência assim mo ditou.

A vida continua.

Sê feliz e continua a fazer bons programas de rádio.

O "nós" - se algum "nós"- terá existido fica por aqui.

Adeus.

Não preciso do teu "lacónico" e habitual  obrigado. 
Deixa-te estar.

Se, por mero acaso, nos encontrarmos, dispenso as tuas saudações. 
Agradecida


Felicidades e muito sucesso.

sexta-feira, 13 de julho de 2018

Sting - If You Love Somebody Set Them Free

Carta de um amor doente.


Escrevo-te uma espécie de carta de amor, das tristes. Das cartas que falam e pedem o amor. Um amor, nosso -  um último reduto a necessidade de te dizer que o meu amor por ti é deixar-te ir pelos teus próprios passos, pelas  tuas  escolhas, até porque são sempre essas que valem e têm razão 
de  existir. Vai, amor meu, que nunca foste, nem amor. Amor meu, se foste de alguém não sei. Que sabemos nós dos outros, ainda que gostemos de ouvir o mesmo concerto de obué?! Eu não aprecio obué, mas eu tenho mau feitio e, por vezes, mau gosto - tu és o meu mellhor exemplo. (Não gosto de obué, mas isso, deve ser, porque sou muito ignorante e, por favor, não me queiras ensinar mais nada,  além do ângulo mais sensual- agora, que  de nada me servirá - das tuas pernas a roçar nas minhas, não me apetece aprender mais nada.) Desculpa a minha sinceridade, nunca leremos os mesmos livros. Com ou sem sofeguidão, o que nos interessava  era aprendemos  a melhor maneira de nos aproximarmos,  quando a noite é quase o dia seguinte e, ainda insistimos em gemer na boca um do outro.
Dizia-te que esta carta de amor é uma carta de amor, um pouco menos ridícula do que as cartas de amor, as habituais...Despeço-me de ti, vou deixar-te, não porque já não aprecie o ângulo do teu abraço no meu peito,  nem  da tua língua atrevida a insistir um cantarolar incompreensivel.Tu cantas bem, a tua língua  desafina um bocadinho, mas isso nunca me incomodou.
Despeço-me de ti, porque estou doente, pertenço ao grupo de pessoas sobre quem todos fazem estatísticas, compram perucas, alvitram menus alternativos e, até oferecem passes em spas extraordinários. Estou doente, tenho uma lesão jeitosa na mama esquerda e se, tudo correr bem,ainda poderei ter as mamas com que sempre sonhei e usarei  chapéu as todas as horas do dia pondo em causa  o protocolo da avó Mariana.
 Vai para os braços de uma Teresa, de uma Sílvia ou de uma Henriqueta, jura - ao contrário da canção do Rui Veloso - que irás ter muitas aventuras, talvez te cases, sejas feliz e compres um apartamento com terraço e janelas de alumínio. 

Não te quero comigo, não aguentarias as agulhas espetadas, a cabeça rapada, o vómito que não cheira a gin, nem a tequilha, a cor pardacenta, as mamas riscadas numa cicatriz brutal.

Dá-me a única prova de amor - que afinal nunca sentimos um pelo outro - e vai para a tua vida tão banal e suburbana , quanto a minha: apenas diferem nos acordes do Satie e no refrão das cantigas da Laura Pausini.


A partir de hoje, estás proibido de (tentar) gostar de mim, ou de me incluires em qualquer playlist ou pensamento mais lúbrico. Por favor, deixa-me desaparecer, para sempre e pensar que terás uma bela família com perú no Natal e prendas no dia do teu aniversário.

Eu estou bem, acredita, quando no colégio imitava a Marisol estava muito longe de imaginar que a vida me daria o amor de uma vida, filhos bonitos, e  casas de janelas rasgadas e luminosas com vista para os rios que correm na minha aldeia. Não sei se tive tudo da vida, espero ter muito mais, mas não fiques à minha espera para jantar.

Recebe o meu beijo.

Recebe-o ao som do Abrunhosa ou da Adriana Calcanhoto, a escolha é tua.



Talvez demore. 

Adeus.