Ouve com
atenção….
Não há
nada de novo. Nada que não saibas. A lua vai veloz para cheia. As
crianças já não gostam que lhes apertes os sapatos e por muito que penses nos
assuntos nada ficará diferente. Agora, debruças-te com muito esforço, porque a
tua força já não é a de outros tempos e torces a esfregona e voltas a torcer,
apoias-te no cabo, insistes o peso do corpo. A água começa a aparecer muito
escura, muito feia, muito espessa. Arrasta o sujo do chão, os pelos do gato, a
ansiedade do cão, os restos do jantar. Nada ficará diferente e, no entanto,
será apenas um chão que ficará mais limpo, não te iludas: a vida ficará igual. Podes ter a intenção de mudar, pensar que no outro lado da rua há um fim e um
recomeço. Mas não. Se pisares o chão que acabaste de lavar. Amanhã. Se o
pisares amanhã, mesmo que a água seja outra, será sempre a mesma, porque entre
um segundo e outro, um pisar de chão, um suspiro, um desejo, um copo de vinho,
a cor da água muito suja não mudará. Será água suja e serão os mesmos pelos de
gato, se tiveres gato, a mesma ansiedade de cão, se tiveres cão. O que resta
então? O que fica? O que esperas da água de uma rua? E de uma esfregona bem
espremida?
Ouve com atenção….
A água suja do balde de plástico da cor que
escolheste irá pela pia abaixo, para o mar, para dentro de outros baldes,
outras águas, mas continuará a ser uma água muito suja de uma esfregona que torceste
com o peso do teu corpo todo, num só esforço, um só movimento a apertar a força das mãos para limpar o
chão que pisas, um dia atrás do outro. Nem bem, nem mal, apenas
isso: água escura. O chão que pisas. O chão que pisas. O chão e as solas dos sapatos por baixo do peso do corpo que carregas. Um dia atrás do outro.
Ouve com atenção...
Ouve com atenção...
Não há chão que se limpe quando os pés que o pisam estão sujos, como não há erva que cresça quando se salga o solo. Gostei. Obrigada pelo texto.
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