segunda-feira, 10 de março de 2014

Sentada na cama a mulher olhava o mar.

Auguste Rodin, O Beijo





Sentada na cama a mulher olhava o mar.

Sentada na cama a mulher olhava o mar. Azul. Em ondas que morriam nos seus olhos. A mulher esperava. O homem que chegaria. Não tardarei. Deito-me a teu lado. Não tardarei. A mulher esperava. Na pele pressentia já a sua língua. A boca na boca. Chegaria, em minutos, o homem. Conhecia-o desde sempre, tratava-o por homem, não sabia o seu nome. Pressentia a pele dele na sua. A língua. Seria o cheiro o primeiro a chegar. Depois os dedos. Depois os dedos. Depois os dedos sem nada para rasgar. A pele. Os olhos na penumbra. A boca. Ah! Sim, a boca. O homem chegou. Encostou-se. Roçou-se, muito devagar, quando se deitou a seu lado. Lembrou-se do seu cheiro. Lembrou-se das mãos. Lembrou-se por inteiro. Chegou-se a ele. Pediu-lhe a pele. Exigiu a língua. Gemiam devagar. A respiração em surdina. Cresciam ao lado um do outro. Rolava o desejo. Enrolavam-se beijos. A língua. Ah! A língua, ela lembrava-se. Exigentes. Sôfregos. Mais lentos, depois mais rápidos. As mãos em nó. A respiração gotejava no  grito. Surdo, o grito. Quase a sair da garganta. Abria-se-lhes, o corpo, a carne. As pernas num só passo, contorciam-se a passos de língua, a gestos de sexo. Colados, sentiram chegar como um tremor desencontrado, o arrepio. Nas mãos abertas e na pele sentiram o corpo a abrir, num soluço, de perna, sexo e língua.

Ficaram parados o resto do dia.

 O resto da noite.

Quando se sentaram na cama olharam o mar pela última vez.

 

2 comentários:

  1. Lembrei-me de uma rosa rubra: sangue, vida, mas algo me lembrou a dor.

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  2. Gostei. Curto e (quase) explícito. :) Um novo tema a explorar, por que não? Gostei mesmo. Fica o beijo. Assim, só. E um abracinho também.

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