Ana Paula,
Ó minha querida, se tu soubesses como gosto de
ti e não estou a mentir, disse-te que não te mentiria, que não sentiria, que
não te falaria de amor, só sei rimar amor com dor, se calhar tenho lido pouco.
Não estou infeliz, não quero a tua infelicidade. Não há aqui nada de trágico.
Vejo a vida como um jogo, gosto de insistir, se calhar para depois voltar a
perder. Encanto-me, desencanto-me com a mesma rapidez com que bebo um copo de
vinho. Gosto do beijo. Gosto de soltar o beijo. Dói um bocadinho, quando me
perco, quando não consigo esquecer, quando não quero esquecer. Não penses que
não me entreguei, que não tentei. Li em todos os dicionários o significado da
palavra amor, procurei em muitas noites, espreitei o fundo de muitos copos.
Minha querida, não me entendas mal, não me odeies e não transformes o meu
abatimento, o meu silêncio, em maus pensamentos contra ti. Também os tenho. Mas
não são contra ti. Ainda. Minha querida, tentámos. Tentei e sabia que ia
perder, tanto terreno por conquistar… Não, não estou ocupado com outras
mulheres. Mentirei se disser que estarei sempre a teu lado. No futuro. Estive
contigo, Ana Paula, quando estive contigo. Não consigo sofrer de outro modo - é
a minha natureza. Preciso do silêncio das minhas duas assolhadas, ao sábado à
tarde, das nuvens de fumo no quarto, gosto de ter as camisas arrumadas por
cores e do meu sofá sem forro e já gasto. Querida, não vou de férias marcadas
na agência de viagens da tua amiga. Já não te oiço quando falas em salas com
mobília completa. Gosto de ir sozinho à lavandaria. Hoje apetece-me uma fatia
de queijo e um copo de vinho. Não quero mais nada. Abro o frigorífico e nunca
encontro gelo, não gosto de Sumol e sei tomar conta das minhas ressacas.
Querida, tira as tuas coisas da minha casa de banho, leva a mala Gucci, as
melhores memórias o sentido de humor, deixa-me ficar a perder. Leva a gata -
não te esqueças - não gosto de gatos. Não tires a televisão do quarto e deixa a
rádio no ar, como eu gosto. Tu já sabias! És bonita, jovem, queres uma família,
férias nas Caraíbas, discutir o mau feitio do galã da novela com o homem que
sentaste, a teu lado, no sofá do Ikea. Vês? Podes ir ao Ikea, ao Centro Comercial
e usar a colónia a cheirar a laranja. Eu quero ver todos os jogos de futebol,
não ter horas para chegar a casa, não quero impor esta minha obsessão: estar só.
Gosto de ser assim: só. Sim, querida, sou egoísta. Serei leviano, vivo dento de
mim, gosto da minha companhia e das nuvens onde preciso, tantas vezes, de descansar a cabeça. Continuarei a
olhar para umas pernas bonitas e um carro de coleção continuará a fazer-me
sorrir. Desejar. Se calhar estou a perder,tenho o coração a bater e só consigo
pensar na felicidade dos próximos dias, porque serão iguais aos de hoje. Depois
de teres partido. Deixa as chaves no armário da cozinha, se faz favor. Vai,
minha querida, vai em paz. Eu não sou homem para casar! E, tu sabias, nunca te
menti. Os homens como eu não são homens para casar.
Serei um homem temporariamente só. (Aceita o advérbio de modo que eu sei que tu detestas.)
Pedro
Belíssimo!
ResponderEliminarÉs fantástica a escrever. Nas coisas mais complexas e sempre 'cantadas' num semblante triste, como o tema Amor, fazes-me sorrir. Eu tal como ele, encontrei-me e sou feliz com o meu eu.
ResponderEliminarEscreve MAIS :-)