Sei de cor algumas histórias que
li, ouvi ou inventei. Outras não sei se são deste mundo, ou de outro mundo
qualquer. Histórias com pessoas, dor e sangue. De pele ferida. Incuráveis.
Inseparáveis: o amor e o que ama. Como uma escultura a que não se consegue
tirar a forma, nem o golpe que a desenha. Um corpo sem encaixar noutro corpo. O
pormenor. A diferença entre o fim feliz e a história triste. E uma linha muito
ténue a separar a realidade da ficção. Escolheu Paris, a pedra, o Sena e um
mestre, a bela Camille Claudel. Um talento a insinuar-se nas primeiras histórias que adivinhou, nos
corpos que esculpiu. Estudou, preparou-se e o génio foi amadurecendo. Amou o
mestre, sofreu os seus desvarios. Nasceu-lhe por dentro a perfeição das obras
que compunham a sua vida. Um talento raro saia-lhe da ponta dos dedos. Ficou só
com a pedra e os gatos.O mestre partiu. Sofreu o amor perdido. Preencheu o
seu silêncio com histórias que inventava. De um outro mundo. Incompreensível.
Invulgar e desconfortável. Vendia a beleza que desenhava na pedra. Não
sobreviveu: definhava e enlouquecia. Assombrava
o talento fanático do irmão Paul e a popularidade de Rodin. Amava e odiava o
seu mestre, o mundo, as pessoas. O carácter, o sofrimento e sua a arte
enfraqueceram-na. Loucura e paranóia, o diagnóstico. Falava-se de esquizofrenia e em mil novecentos e treze é
internada num asilo. Convive com a doença, a alienação, as chagas da alma e do
corpo durante trinta anos. Morreu triste, sem amor, sem liberdade e sem o seu trabalho. Infeliz e lúcida.
Um
talento invulgar, dir-se-á mais tarde.
Esta história de loucura e
genialidade cresce nos olhos de Juliette Binoche. A belíssima Juliette
Binoche, o mistral e uma paisagem árida. Uma triste história de amor e O Magnificat,
de Bach a tirar-nos o ar. Bruno Dumont realiza ou esculpe a infeliz e bela
Camille Claudel.
( Camille Athnaïse Cécile Cerveaux Prosper nasceu a oito de
dezembro de mil oitocentos e sessenta e quatro a escultora Camille Claudel
nasceu e morreu mais tarde, por amor e por talento.)
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