quinta-feira, 23 de maio de 2013

Ao telefone com Clarice Lispector



Um telefonema

  O telefone tocou, eu atendi, chamaram por mim. Em geral pergunto quem é porque nem sempre estou disposta a ser chateada.
  Mas dessa vez alguma coisa na voz, doce e tímida, me fez dizer que era eu mesma que estava ao telefone. Então a voz disse: sou uma leitora sua e quero que você seja feliz. Perguntei: como é seu nome? Respondeu uma leitora. eu disse: mas eu quero saber seu nome para poder dizê-lo ao desejar que você seja feliz. Mas foi inútil, ela não tinha sequer diante de mim sequer a vontade de aparecer como pessoa que é. Era o anonimato completo. Mas para você, de quem nem ao menos sei o nome, quero que tenha alegrias e que, se já não é casada, que encontre o homem da sua vida. Peço também que não leia tudo o que escrevo porque muitas vezes sou áspera e não quero que você receba minha aspereza.
 
   Clarice  Lispector, A Descoberta do Mundo
 
 
     É claro, que eu não sou a Clarice Lispector, nem tenho o seu talento de exceção, não vivo nem sofro com a mesma intensidade com que ela o fez. Não tenho  pretensões a tanto. No entanto, estivemos a falar ao telefone uma com a outra, distâncias e diferenças salvaguardadas, passo a explicar - hoje, ao abrir a minha página do Facebook - como são distintos os tempos em que ambas vivemos - encontrei de uma "leitora" virtual a seguinte mensagem:
 
 " Gosto tanto daquilo que escreve, das referências que faz a autores de que eu nunca ouvi falar, das músicas que com todos os seus amigos, por aqui, vai partilhando, muitas dessas músicas eu nunca tinha ouvido antes, gosto tanto de a visitar e de agora ler o seu blog, que me dirijo a si, desculpe o atrevimento, para lhe desejar tantas felicidades e alegrias, como alegria e felicidade eu sinto quando a leio e oiço a sua  música.  Não precisa de me fazer sua amiga, porque eu já tenho o que escreve".
 
     Em lágrimas, num ápice, voei para até a um qualquer Olimpo.
O meu coração batia sem ordem. Sentia-me feliz.  A felicidade  da partilha, da entrega, do abraço, da presença de alguém a nosso lado. Anónimo, mas ali. Amizade virtual? Amigos com quem nunca falámos? Nada disto existirá, realmente?
 
Não sei, de momento, não me apetece responder a perguntas difíceis - ainda estou a ler, em voz alta, a mensagem da minha nova amiga. A Clarice  percebeu sem dificuldade a minha alegria e partir de hoje falaremos, ao telefone, com alguma regularidade.
 
 
 

1 comentário:

  1. Bonita mensagem.
    É o reconhecimento de que a tua escrita e tb a tua cultura provocam emoções. E isso é muito bom.
    Bjos

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