quarta-feira, 29 de maio de 2013

As flores amarelas

Manuel San Payo
 
 
 
 
 
O Manuel San Payo desenhou estes gladíolos e ofereceu-mos. Ou serão amores-perfeitos?
Bonitas as tuas flores. Estas minhas flores são amarelas.
Tenho um gosto, uma preferência, uma alegria por flores amarelas, desde que me entendo como gente a gostar de alguma coisa. É-me indiferente serem rosas, cravos, mimosas, gerberas, gladíolos... Qualquer flor amarela me põe os olhos a brilhar. Fernando Pessoa, ou será o Caeiro? (Não me lembro). Um deles dizia que "é triste pôr flores em jarras". Sim, se só olharmos e virmos flores em jarras. Eu gosto de ter a casa cheia de flores amarelas. Fazem-me companhia e  iluminam o ar que respiro. Gosto de as trazer com muito cuidado, embrulhadas em papel de florista. Escolher a jarra, a prateleira, a mesa, onde as vou mostrar. Mudo-lhes a água, afasto-as ou aproximo-as da luz, apanho as pétalas que morrem, conto-lhes o meu dia. Falo-lhes como se fala  com as flores. Uma lista das minhas coisas preferidas, dos meus segredos, dos meus cantores, da minha música, das minhas alegrias, das minhas tristezas:  em primeiro lugar, gosto número um, flores amarelas, gosto número dois, rosas amarelas, em botão, de preferência. Malmequeres também estão bem. Haverá neste meu gosto uma explicação num compêndio de botânica ou de  filosofia. Haverá. A minha  é muito simples: gosto de flores amarelas, porque sim, porque me trazem sol, porque me lembram gargalhadas, pão quente e um canto da sala da casa da minha Avó, onde havia sempre flores. Nem sempre amarelas. Quando ponho as flores em água, vou até ao tempo em que o meu Avô oferecia flores à minha Avó. Os pensamentos que me levam até à jarra de porcelana da sala da minha infância são felizes, a cheirar a marmelada e a  barrela feita no fogão para melhor dissolver o sabão e as nódoas. Há nestas memórias um colo e um abraço de dois amigos que não se veem há muito tempo. Um calor bom. Um calor de um sol à beira de um rio. Na primavera. Um maio que me leva para um lugar secreto de histórias, rendas, biscoitos e lápis de cera. A  cheirar a flores amarelas. Quando trago para casa flores amarelas e escolho uma jarra transparente é uma história que estou a contar, melhor, é uma história que estou a inventar. Com um final feliz. 
As flores amarelas murcham. Mas eu insisto em mudar-lhes a água todos os dias.

7 comentários:

  1. Tb gosto de amarelo. Nas flores, nos tecidos, no sol. Gostei do teu texto.

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  2. Amarelo é luz e boas recordações. Um beijo.Vai aparecendo.

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  3. São frésias amarelas e maravilhosas eu tomei-as por gladíolos amarelos. Flores amarelas, as minhas flores.
    Muito obrigada pela visita, vai aparecendo.

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  4. Sinto cheiros neste
    texto tão poético..tb gosto muito do amarelo não só nas flores, o meu pai tb não gostava que arrancassem do «seu» jardim as flores para a jarra.Parabéns pelo texto!

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