domingo, 12 de maio de 2013

Lisboa não sejas francesa

"Lisboa não sejas francesa com toda a certeza não vais ser feliz", reza o fado cantado pela Amália, no século XIX, por outras palavras, Eça de Queiroz, fazia o mesmo pedido e referia como nós portugueses somos tão provincianos e atrasados que consideramos apenas o que vem do estrangeiro. Se for inglês, francês, alemão e, agora, chinês, é bom de certeza. Se for chinês tem duas qualidades: é barato e estrangeiro. Não sei de onde nos vem esta mania, mas ela ainda nos caracteriza. Nós portugueses não consumimos, não defendemos, não amamos o que é nosso. Não lemos os nossos romances, não vemos os nossos filmes, não conhecemos a nossa poesia (ficámos no Camões porque não tinha um olho; no Bocage porque contava anedotas e no Pessoa porque foi moda, mais ou menos como a Nespresso e o George Clooney), não conhecemos os nossos pintores, não ouvimos os nossos músicos - exceção para o Tony e os tampões da Joana-, de escultura portuguesa nunca ouvimos falar e não sabemos soletrar o nome - em português - de um cientista que se destaque "nesta ditosa Pátria minha amada". Mas devoramos tudo o que seja estrangeiro. Das sombras de Grey ao Häggen Dazz, do Nicholas Sparks ao Código da Vinci, do Conan O'Brian ao algodão turco. Tudo o que tenha um nome difícil de pronunciar e/ou já tenha "passado"na televisão. De arrepiar o espaço que em qualquer dessas grandes superfícies, agora com o nome de livrarias, é dado à literatura portuguesa. Poesia, ficção e ensaio, incluídos. Do cinema português nem se fala, nem se vê um dvdzinho para amostra. " Não temos, mas podemos encomendar". Música?! "Não passa na rádio. Não conhecemos. Mas podemos encomendar." Estou em crer que não se trata apenas de questões de distribuição ou de divulgação. Trata-se de um preconceito. Uma fraqueza envergonhada. "AH! Estou a ler o último ensaio do lodge e acho sublime o romance do auster" (até pode ser, são muito bons autores, sim, não se discute).Mas e o último livro de poesia de Pedro Tamen, de Fernando Pinto do Amaral? Já ouviram falar? Não, portanto, ler está fora de questão. Romances recentes de autores portugueses? Não, talvez a" Rebelo Pinto, sim, tem imensa graça". Os portugueses leem pouco? Talvez leiam, literatura portuguesa, em língua portuguesa, não leem. Talvez se estivesse embrulhada em tule ou oferecesse uma escapadela romântica? Talvez, se oferecesse, pelo preço de um português três do Stephen King ou da Julie GarWood ou mesmo do Paulo Coelho, é em português, certo? Ler na língua original - o supremo indício de cultura! Ora se for um autor português estará escrito em português, não é verdade? Pois, mas isso não distingue, não ofusca. " Il faut éppater le bourgeois". Nós somos assim, provincianos, encolhidos, envergonhados, agora, miseráveis e tesos. Ler para quê? Gastar dinheiro num bilhete de cinema para ver um filme português? Nem pensar! " E se o vizinho do primeiro andar se cruzar comigo na bilheteira?" "O que direi, quando me perguntarem se já vi o último filme com o Leonardo Di Capprio?"
Toda esta minha verborreia, mais ou menos inflamada, vem a propósito do belíssimo romance de Patrícia Reis, que ninguém leu e do filme de Vicente Alves do Ó, Quinze Pontos na Alma, que ninguém viu. Isto sou eu a falar, claro, que sou portuguesa e gosto de o ser. Sem preconceitos.
(Vá lá, a cultura portuguesa não é uma chatice. Acreditem em mim, que sou do bem!)
L.C.D.

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