Chove. Há pouco dizia que os
jacarandás azulavam uma das cidades da minha infância. Em maio, às vezes, em
abril, já se viam impassíveis as flores a abrirem-se ao sol, do sul. Os jacarandás chegavam-se a nós e a todos os nossos sentidos. Chove. Na
minha rua, nesta cidade que agora me pertence também há jacarandás. Sorriem
para o Tejo. Mas há uma película de água que se agarrou às janelas, às portas,
às paredes, ao chão. Transparente cobre as flores dos Jacarandás. Rente ao
chão, mistura-se com a seiva das flores azuis. O Tejo vestiu-se de cinzento e
empurrou para longe o azul. De uma janela de um edifício moderno, neste fim de
tarde, não se avista a margem sul do Tejo. No sofá, enterrada e encolhida,
espero que me chamem. Manchas encarnadas nas paredes amarelas. Sentada, olho a
chuva. A névoa colada aos vidros. Regresso aos jacarandás e às ruas da minha
cidade ao sol e à beira-ria. Chamam um doente e depois outro. Espero o meu
nome. A conversa atravessa programas de televisão, vidas que não conheço. A
minha vez tarda. Jacarandás azuis, paredes amarelas, um Tejo que não se
distingue e pessoas que não conheço. “ Na escola primária onde fiz o exame da
4ª havia uns extraordinários jacarandás”, acrescento ao tumulto provocado pela
estrela de televisão na primeira página da revista. “ Passei a minha infância
ao sul a ver os jacarandás florirem. “ Entra outro doente. Impaciento-me no
estofo, na chuva e no vento que abana as árvores no pátio amplo e moderno. Sala
de espera virada para o rio. Escurece. Um minuto e o azul-jacarandá será cor da
noite e do frio. A espera afasta a memória feliz de uma cidade azul, no mês de
maio. Continua a chover. Morrem as cores alegres, a partir desta janela. Fim de
uma tarde com chuva e sem candura. Pensar nas cores alfazema-azulada,
azul-jacarandá, lilás-jacarandá e esperar.
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