quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Ai, tu!

http://youtu.be/fHjZQb-kGek

A Kiss To Build A dream On



Ai, tu!

 Talvez cozinhe uma feijoada com arroz basmati, ficará um prato ecuménico, o que interessa é que os miúdos  comem bem o que se lhes puser no prato, estão a crescer, têm sempre fome, e perguntam tudo, a paciência não se dissolve como uma carteira de antipirético, o benuron  faz baixar a febre, mais nada,  o grito de gaivota voltou, entretanto, será preciso mudar a água às margaridas, começam a murchar e seguem os raios de sol que entram na sala, durante um ano a vida muda,  acontecem  um ror de peripécias, Odeceixe tem o mar muito azul e, apesar de, o mar não ser o mesmo, será sempre o mesmo e igual, a caixilharia em alumínio de um  quarto de pensão de terceira categoria é o sinal que  as histórias que acabam mal estão sempre a acontecer, a febre baixou, as músicas do Ipod  dos  miúdos foram tiradas do youtube, deve ser pirataria e para  que servirão  as prateleiras cheias de bela música ?! Mas isto é assim como gostar do amarelo, não  se pode obrigar os miúdos a gostarem das mesmas canções, têm bom gosto, às vezes, não é coincidente, é só  ver que há mulheres (e homens) muito sensaborões, vestidos de um castanho indefinido, agora diz-se taupe, muito  certos e com muitas linhas  no curriculum e doutoramentos em assuntos fraturantes A importância-da-isotopia- da-cidadania-na-construção-de-um–saber-multidisciplinar-integrador-de-diferentes- metas- do-saber, um fôlego para se dizer o titulo, sempre muito atentos ao próximo e a amar muito o próximo e a defender as injustiças, nunca viram uma telenovela, nem dizem palavrões, pessoas com quem nos cruzamos na rua, todos os dias, muito atentas ao livro onde mergulham os olhos, sempre de autores desconhecidos, amam tudo e dizem todas aquela verdades libertadores, deite tudo cá para fora e desabafe e ame muito, muito a vida, mas depois penso que é tudo, outra vez, como gostar do amarelo, não se podem discutir as cores que fazem bater o coração de cada um, ter uma senhora que nos ajude nas coisas da casa é um hábito burguês, há quem não goste  que  se lhes arrume as cuecas e diga que  se tirarmos a carne congelada, de véspera, do congelador e a pusermos na parte de baixo do frigorífico, irá perdendo o gelo, mas o sabor mantem-se e a Conha Buika  canta, com uma voz maravilhosa, Las Simples Cosas, quando se olha para uma gravura em tons de cinza e dourado de vários matizes e brilhos, com uma moldura também dourada, mas com um vidro igual ao que se usa nos museus, não se vê o reflexo, fica uma macha de cinza e amarelo dourado numa parede branca, a gravura fica muito bonita, em baixo está uma outra com vidro normal, representa um barco em tons de cinza transparente  e azul claro, o vidro não é o que se usa nos museus e o  barco fica menos visível e, no entanto, é um barco, podia levar-nos para qualquer lugar, uma esperança qualquer, os dois quadros são uma metáfora da vida, o dia mais triste do calendário católico apostólico romano pode ser um dia muito feliz,  num ano e de uma grande mágoa, no ano seguinte, pensemos que o dia de natal talvez venha compor as alegrias e não há como um dia atrás do outro, as idas  ao supermercado devem ser feitas com muito cuidado e uma máquina de calcular, deve verificar-se o IVA e não comprar nada que não seja necessário, as compras ficam  iguais  a algumas pessoas  - cor taupe, uma cor parda que advinha uma vida também parda, nunca se sabe o que veem em nós, a imagem que damos é a imagem que faz, quer, deseja ou ama para quem nós olha, a acreditar, acredite-se  só no espelho e, mesmo assim, devemos desconfiar, algumas lojas têm espelhos que emagrecem, na Feira Popular havia uns espelhos que olhavam para nós como formas estranhas, nos provadores da Zara há uns espelhos que adelgaçam a silhueta (um bonito conjuntinho de palavras), os sacos de papel castanho que muitas pessoas trazem nas mãos, é uma mania de antes e durante o agora, um saco nas mãos dos portugueses, os sacos Zara foram substituídos por uns mais claros que dizem Primark a letras azuis, têm  de ser muito resistentes, porque transportarão as mais variadas intimidades  e, até, o almoço, mesmo nos dias de chuva, quando chove muito, os melhores são os de plástico, na época  dos saldos, muito mais resistentes,  há ainda muitas palavras por dizer e por escrever e olhar, nesses momentos as dores ficam suspensas e ir não é nenhum sofrimento, as dores aparecem quando começamos a sentir o que nos permite ser,  mas não deverá ser sentido, o joelho dói, a cabeça dói, a alma dói, vivemos bem quando não sentimos  que o joelho a cabeça e a alma existem, há quem viva uma vida inteira com muitas dores e com pouco dinheiro e sem dinheiro nenhum, há muitas vidas, basta olhar para as paragens dos autocarros, os carros parados nos semáforos, os centros comerciais, os hospitais, há muitas vidas a ser vividas e há muito outras que desaparecem, num ápice, é tudo muito rápido, a interpretação de um texto literário não pode ser feita  à pressa, olhar para um quadro de Marc Chagall deve ser feito com os olhos mais lentos, como o desejo do corpo de quem se ama, devagar, e com os sentidos todos, os pensamentos que ocupam as cabeças das pessoas são todos diferentes uns dos outros e estão contaminados com o que cada um fez com a sua própria vida, para não se pensar nas vidas  existem os livros, ler é uma redenção, um prémio, escrever só interessa a quem escreve, no momento que escreve, entre uma afirmação e outra, há um paradoxo, o que não retira a verdade às duas afirmações.

( Eu já te tinha dito que a tua cabeça não deve servir para pensar. Tu não me dás ouvidos. Ai, tu! )

3 comentários:

  1. «ler é uma redenção, um prémio» e, por isso o teu escrever me interessa. Gostei muito.

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  2. pois, mesmo que seja com frases curtas ou longas, pois pouco importa, é-se capaz de tudo, como arroz branco ou basmati, na verdade, e depois, se pensarmos bem, o que seria a vida sem paradoxos e merdas. O grande drama é a coisa do copo meio vazio, é melhor dar graças por se ter um copo. Beijos

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  3. Escreves com o coração nos olhos: és uma escrevente fotógrafa cardíaca.

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