A Kiss To Build A dream On
Ai, tu!
Talvez cozinhe uma feijoada com arroz basmati,
ficará um prato ecuménico, o que interessa é que os miúdos comem bem o que se lhes puser no prato, estão
a crescer, têm sempre fome, e perguntam tudo, a paciência não se dissolve como
uma carteira de antipirético, o benuron faz baixar a febre, mais nada, o grito de gaivota voltou, entretanto, será
preciso mudar a água às margaridas, começam a murchar e seguem os raios de sol
que entram na sala, durante um ano a vida muda, acontecem um ror de peripécias, Odeceixe tem o mar muito
azul e, apesar de, o mar não ser o mesmo, será sempre o mesmo e igual, a
caixilharia em alumínio de um quarto de
pensão de terceira categoria é o sinal que as histórias que acabam mal estão sempre a
acontecer, a febre baixou, as músicas do Ipod
dos miúdos foram tiradas do
youtube, deve ser pirataria e para que
servirão as prateleiras cheias de bela
música ?! Mas isto é assim como gostar do amarelo, não se pode obrigar os miúdos a gostarem das mesmas
canções, têm bom gosto, às vezes, não é coincidente, é só ver que há mulheres (e homens) muito
sensaborões, vestidos de um castanho indefinido, agora diz-se taupe, muito certos e com muitas linhas no curriculum e doutoramentos em assuntos fraturantes A importância-da-isotopia- da-cidadania-na-construção-de-um–saber-multidisciplinar-integrador-de-diferentes-
metas- do-saber, um fôlego para se dizer o titulo, sempre muito atentos ao
próximo e a amar muito o próximo e a defender as injustiças, nunca viram uma
telenovela, nem dizem palavrões, pessoas com quem nos cruzamos na rua, todos os
dias, muito atentas ao livro onde mergulham os olhos, sempre de autores desconhecidos, amam tudo e dizem todas aquela verdades libertadores, deite tudo cá para fora e desabafe e ame muito, muito a vida, mas depois penso que é tudo, outra vez, como gostar
do amarelo, não se podem discutir as cores que fazem bater o coração de cada
um, ter uma senhora que nos ajude nas coisas da casa é um hábito burguês, há
quem não goste que se lhes arrume as cuecas e diga que se tirarmos a carne congelada, de véspera, do
congelador e a pusermos na parte de baixo do frigorífico, irá perdendo o gelo,
mas o sabor mantem-se e a Conha Buika
canta, com uma voz maravilhosa, Las Simples Cosas, quando
se olha para uma gravura em tons de cinza e dourado de vários matizes e
brilhos, com uma moldura também dourada, mas com um vidro igual ao que se usa
nos museus, não se vê o reflexo, fica uma macha de cinza e amarelo dourado numa
parede branca, a gravura fica muito bonita, em baixo está uma outra com vidro
normal, representa um barco em tons de cinza transparente e azul claro, o vidro não é o que se usa nos
museus e o barco fica menos visível e,
no entanto, é um barco, podia levar-nos para qualquer lugar, uma esperança
qualquer, os dois quadros são uma metáfora da vida, o dia mais triste do
calendário católico apostólico romano pode ser um dia muito feliz, num ano e de uma grande mágoa, no ano
seguinte, pensemos que o dia de natal talvez venha compor as alegrias e não há
como um dia atrás do outro, as idas ao
supermercado devem ser feitas com muito cuidado e uma máquina de calcular, deve
verificar-se o IVA e não comprar nada que não seja necessário, as compras ficam
iguais a algumas pessoas - cor taupe, uma cor parda que advinha uma
vida também parda, nunca se sabe o que veem em nós, a imagem que damos é a
imagem que faz, quer, deseja ou ama para quem nós olha, a acreditar,
acredite-se só no espelho e, mesmo
assim, devemos desconfiar, algumas lojas têm espelhos que emagrecem, na Feira
Popular havia uns espelhos que olhavam para nós como formas estranhas, nos
provadores da Zara há uns espelhos que adelgaçam a silhueta (um bonito conjuntinho de palavras), os sacos de papel
castanho que muitas pessoas trazem nas mãos, é uma mania de antes e durante o
agora, um saco nas mãos dos portugueses, os sacos Zara foram substituídos por
uns mais claros que dizem Primark a letras azuis, têm de ser muito resistentes, porque
transportarão as mais variadas intimidades e, até, o almoço, mesmo nos dias de chuva,
quando chove muito, os melhores são os de plástico, na época dos saldos, muito
mais resistentes, há ainda muitas
palavras por dizer e por escrever e olhar, nesses momentos as dores ficam
suspensas e ir não é nenhum sofrimento, as dores aparecem quando começamos a
sentir o que nos permite ser, mas não deverá ser sentido, o joelho dói, a
cabeça dói, a alma dói, vivemos bem quando não sentimos que o joelho a cabeça e a alma existem, há quem
viva uma vida inteira com muitas dores e com pouco dinheiro e sem dinheiro
nenhum, há muitas vidas, basta olhar para as paragens dos autocarros, os carros
parados nos semáforos, os centros comerciais, os hospitais, há muitas vidas a
ser vividas e há muito outras que desaparecem, num ápice, é tudo muito rápido,
a interpretação de um texto literário não pode ser feita à pressa, olhar para um quadro de Marc Chagall
deve ser feito com os olhos mais lentos, como o desejo do corpo de quem se ama,
devagar, e com os sentidos todos, os pensamentos que ocupam as cabeças das
pessoas são todos diferentes uns dos outros e estão contaminados com o que cada
um fez com a sua própria vida, para não se pensar nas vidas existem os livros, ler
é uma redenção, um prémio, escrever só interessa a quem escreve, no momento que
escreve, entre uma afirmação e outra, há um paradoxo, o que não retira a
verdade às duas afirmações.
( Eu já te tinha dito que
a tua cabeça não deve servir para
pensar. Tu não me dás ouvidos. Ai, tu! )
«ler é uma redenção, um prémio» e, por isso o teu escrever me interessa. Gostei muito.
ResponderEliminarpois, mesmo que seja com frases curtas ou longas, pois pouco importa, é-se capaz de tudo, como arroz branco ou basmati, na verdade, e depois, se pensarmos bem, o que seria a vida sem paradoxos e merdas. O grande drama é a coisa do copo meio vazio, é melhor dar graças por se ter um copo. Beijos
ResponderEliminarEscreves com o coração nos olhos: és uma escrevente fotógrafa cardíaca.
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