domingo, 19 de maio de 2013

Amor incondicional

 
   Primeiro recebemos a notícia, a boa notícia. Satisfeito o desejo, veio o que pedimos: a bênção. Ficamos à espera numa ansiedade única e que só nós conhecemos. Virá bem? Estará inteiro? Enxuto? Quando acaba a espera, nascem bons, nascem rosados, a cheirar a leite e a ternura. Exigem colo, roubam noites e luz   como se  e o  quotidiano deixasse de nos pertencer. Inventamos outro,  alteramos a duração das horas e a cor do sol. Clareamos as sombras. Não quiseram  nada, mas tudo nos pedem. Nós oferecemos. Felizes. Gostamos de dar, vamos construindo um amor -  o Amor - incondicional e eterno, enquanto vivermos. Suspendemos as nossas gargalhadas e rimos das primeiras palavras. Quando aprendem a ler e a distinguir o mundo que cresce com eles, percebemos o olhar noutra direção. É assim: a vida que se constrói como a nossa se cumpriu, o tempo fará o que nós não soubermos fazer. Não nos queixamos das dores, refletimos e interrogamos o coração e a razão em todos os minutos os de agora e os de amanhã.
   A um tempo, sem aviso, deixam de caber na moldura, na cama e no dia seguinte. Percebemos a mudança, choramos as alegrias, entendemos as ansiedades e a perplexidade perante o corpo que não controlam. Tudo questionam e começam a falar uma língua diferente da nossa. Conversamos e procuramos todas as palavras, todos os significados em todas as gramáticas. Estão distantes e não querem que nos aproximemos. Não gostam do que ensinamos, nem do que fazemos, nem do que amamos, nem do que cozinhamos. Cospem os conselhos sem bondade e sem delicadeza. A vida que não compreendem é uma ameaça obediente a um horário. Uma vida  de tarefas que insistem em não fazer. Não fazem, não gostam de fazer, não cumprem, não respondem, vivem, um dia e outro dia, debaixo de um céu sem estrelas. Se chove, no momento a seguir, faz sol - como na canção -, protestam, perdem os sapatos, espalham os livros, as mágoas e a roupa suja. As palavras, sempre numa língua diferente, são sons surdos, vazios e carregados de silêncios. Às vezes vem um grito. Outras vezes, um pedido, outras vezes, ainda, encolhem os ombros. Suspiram pela amiga com a mesma certeza com que espremem a última borbulha.  Não esquecem o colo, mas não precisam dele para nada -  insistem em lembrar-nos. Não. Não. Não. Como o sim de uma promessa que temos de cumprir. Nós ficamos com o Amor, à espera que um outro tempo surja. Eles também. Não sabemos como serão os dias que - ainda -  nos pertencem. Desses dias nada sabemos. Eles também não. Da vida sabem tão pouco!
Aqui, deste lado, pensamos:" Que sejam do bem." Porque foi só isso que para eles sonhámos.


3 comentários:

  1. Muito obrigada por este texto belíssimo. Se o entendo bem ...

    Mas ficamos à espera com o amor nas mãos!

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  2. Gostei muito do texto. Com maior ou menor intensidade, a "gerenation gap" repete-se. Revi-me (meus deuses!) e relembrei, comparando também, as fases das minhas princesas. Obrigada por me proporcionares este momento de reflexão.

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  3. Maravilhoso texto, onde todas as mães se reveem. Continue a deslumbrar-nos com a sua escrita! Beijinhos

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