Chove.
Quando as gotas grossas da chuva caem, formam no espelho que
a água derramou, uns círculos perfeitos, transparentes e repetidos. Num desenho
exato que não para e não se repete. Um círculo perfeito pequeno e redondo, um
círculo perfeito, cada vez maior. Uma argola pequena de água, que se espalha e
desenrola numa argola maior e longe. Ajustam-se estas águas, mas não se abraçam
e pingam, pingue-pingue, uma a uma, da mesma nuvem escura, disforme e cheia. Tingem-se
de cores de rua: alcatrão, laranja pintado de castanho do barro que se desfaz,
cinzento-escuro, prata pintada a verde. As cores do sítio onde caem. Redondas. Musicais. Quando
não há vento, as gotas grossas da chuva espalham círculos perfeitos que não se
tocam. Crescem. Afastam-se.
De cima, da janela que espreita a chuva, vejo o lago que tapa
ou molha as solas dos sapatos. Agora, a noite apagou o céu e o brilho do rio. Os
círculos perderam a perfeição e a luz. O vento veio com a noite e limpou as
linhas perfeitas. Arrasta-as para outras formas, outras margens. As gotas mais
longas vêm velozes e acossadas, pelos caminhos abertos entre os prédios e as
varandas largas. Ruidosas. As copas das árvores e os candeeiros deixam-se ir nesta dança.
Água e vento. A acompanhar a luz e a sombra, a chuva corre para o rio, rolos
de folhas, papéis, plástico e troncos partidos. O ritmo mais veloz à procura do
sossego da água larga e escura. Distante. À beira das luzes da cidade.
Lindo. São parágrafos do teu livro.
ResponderEliminarÉs mesmo muito gentil. E logo tu, professora de Português com km de páginas lidas e estudadas!!!
ResponderEliminarFico tão vaidosa. Obrigada, amiga.
Textos soltos e tão belos. Sim, espero-os um dia num livro à minha mesa de cabeceira.
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