As palavras
No princípio era o
verbo. Sabemos. E quanto vale um silêncio recomendamos aos nossos. Têm um dom:
têm vários dons, têm várias vozes, várias peles, várias linhas que se cruzam e
se descobrem e se despem e vestem com pudor, ou sem pudor. Tão traiçoeiras,
feiticeiras e fadas que a enganos e certezas se oferecem. Num momento, a
promessa de uma palavra que pertence, no momento seguinte, perdida. A promessa
não se disse. Segredo à luz. Dor que poderia não rimar, ou rimar, ou soletrar,
apenas, amor e esquecer. Dito. Não dito. A palavra e o eco que se quis ouvir.
Certa. Insinua-se, faz-se de surpresa. O ar de um suspiro, quando de pedra, que
nem nós somos, queremos que seja. Palavra, para sempre a pertencer, sem dúvida,
sem sofrimento, a rimar por dentro. Um
entendimento, um escasso segundo, o devaneio leva-a o vento, a rimar com
desalento. Disse. Não dito. Conjugações, pronomes sem pessoas como se a nenhuma boca tivessem
pertencido. Agarram-se ao quente, acomodam-se no calor, pedem colo, sexo,
prazer e a mão. Na mão. Na nuvem, a um só céu pertenceram. Fugidias sem memória
e sem tempo. Granito, betão, ou vidro, tanto faz. Valem o escasso momento do sonho
que foram. Soletradas. Afagos. As palavras, como se no plural fossem, falam. A
palavra, no singular, quando a um só abraço pertence e é. Água, chão, nudez,
canto, braço, coração, dedos, cabeça e pés. Tudo se mistura. Quando se pertence
na palavra certa que sem tempo, a um tempo, a dois, a um pertenceu. Foi. O
momento. Caiu no chão desfez-se em saudade e tristeza, na promessa que saiu, de
dentro, de verdade e à verdade daquele momento, apenas, pertenceu.
Desarranjam-se num instante e quebram a eternidade que vale um suspiro. A
palavra de tudo é ar, cama e berço. As palavras são de ninguém, de nada e no
chão rolam e voltam. As palavras. E a palavra, verbo é no princípio. Onde
começa. Onde morre. E em fumo se esvai ferida aberta de sentimento. Ou grito. As
palavras. A palavra.
(A palavra não
vale. Sente o que queiramos que valha. Vale o que quisemos sentir. E,em silêncio,adormecemos.)
Sem comentários:
Enviar um comentário